Passo a passo como usar materiais acústicos mantendo a boa estética
Propósito molda nossas escolhas e dá formas à imaginação. Você já deve ter ouvido a frase de Oscar Niemeyer: “Arquitetura é antes de mais nada construção, mas, construção concebida com o propósito primordial de ordenar e organizar o espaço para determinada finalidade e visando a determinada intenção”. Em cada ambiente há um ser humano e cada ser exige uma experiência única que o ambiente favorece. O que quero dizer é que com intencionalidade se organizam os espaços, e esses espaços são pensados para os nossos sentidos, esses mesmos sentidos que nos levam a sensações, sendo que essas sensações marcam em nossa memória. Neste artigo quero te mostrar como utilizar materiais acústicos pensando em estética visual, tátil e olfativa, mas sem esquecer do sentido auditivo, e quem sabe até do paladar.
Quando pensamos em escolhas funcionais, em geral pensamos em materiais arquitetônicos feios e com propriedades técnicas avançadas. Em geral o valor percebido é alto somente para quem é técnico e quem enxerga o que está por trás do material. Mas para o leigo, nem sempre o que é tecnicamente melhor é reparado e valorizado. Os arquitetos projetam experiências, e essas quanto mais completas forem, mais interessantes se tornam os ambientes. Se você já foi a museus e teve experiências sensoriais e artísticas sabe do que eu estou falando. Mas se você ainda não teve a oportunidade de desfrutar de um ambiente com qualidade sonora e não somente visual, talvez tenha dificuldade de pensar e recomendar produtos que se encaixem em projetos requintados.
Os materiais acústicos utilizados para o conforto sonoro podem ser dos mais diferentes formatos, cores, texturas e propriedades técnicas. O que estamos em busca como profissionais da acústica, é em geral, as suas características ligadas à reflexão, absorção e difração. Vou explicar cada uma dessas propriedades que são o passo a passo para um bom projeto acústico.
Passo 1: Defina como direcionar a reflexão
Quando falamos de reflexão, temos a reflexão especular, que é representada pelo retorno da onda sonora para o meio de origem após a onda atingir o material, de forma que ela é refletida diretamente sem espalhamento da energia. Isso também ocorre com a luz em um espelho, que retorna a imagem da pessoa que se vê no espelho diretamente quando se olha em direção perpendicular ao plano do espelho. Quando colocam um espelho atrás das suas costas para você ver como ficou o seu cabelo, há um jogo de reflexões especulares que te permite ver com nitidez sua nuca, e isso também ocorre com o som em superfícies rígidas e planas. O som é uma onda, assim como a luz, só que de mais baixa frequência do que a luz. Mas o princípio de reflexão é o mesmo. Então, se você quiser ter nitidez no som em uma certa posição de audição, simplesmente coloque um material rígido que funcione como um espelho, para direcionar a reflexão do som para aquele local. Entendido? Isso ocorre com grande frequência em auditórios e salas de conferência que necessitam manter a nitidez da voz do orador, e com isso se mantém a inteligibilidade, ou seja, a capacidade de se entender claramente o que o orador fala.
Agora se a reflexão é difusa, o que ocorre é um espalhamento da energia sonora para diversos lados. Sabe quando se tem uma lâmpada simples que dá uma sombra “dura” no rosto de alguém? Tente substituir essa lâmpada por um anel com diversas lâmpadas em frente ao rosto “como um ring light” e veja o que acontece. Ou ainda, quando se tem uma lâmpada atrás de um vidro jateado que acaba funcionando como uma superfície que emite luz. Isso tudo gera uma luminosidade mais homogênea no ambiente. Agora voltando para o som, um ambiente com o som difuso pode ser muito bom para alguns tipos de passagens e estilos musicais, ou ainda para dar uma sensação de espacialidade na voz. Em ambientes com bastante difusão sonora, as reflexões difusas causam uma melhor impressão do volume do ambiente e também tornam o decaimento sonoro mais suave, sem grandes quebras que podem gerar desconforto auditivo. Na música clássica, em geral deseja-se tempos de reverberação maiores e bastante difusão para que todos os instrumentos musicais se fundam e sejam apresentados como um som único e harmônico.
Portanto, na hora de escolher os materiais para reflexão, pode abusar das cores, mas tenha em mente que eles devem ser rígidos e com superfícies lisas e planas se você está procurando reflexões especulares. Mas se você está procurando reflexões difusas, ai a rugosidade da superfície, ou ainda o uso de padrões matemáticos de repetição são mais do que desejáveis. Um grande estudioso deste assunto foi Manfred Schroeder, que morreu em 28 de Dezembro de 2009 com 83 anos. Schoeder nasceu na Alemanha e sempre se interessou por matemática, tendo trabalhado no Bell Laboratories e na University of Göttingen. Em 1975 ele descobriu os difusores de resíduo quadrático QRD, os quais são utilizados amplamente em salas de concertos e em estúdios de gravação. Com esses estudos matemáticos e psicoacústicos ele também auxiliou na criação de padrões musicais como o MP3, AAC, e também na criação de softwares de simulação de reverberação realísticos.
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Passo 2: Adicione absorção na medida certa
Essa propriedade é a mais importante e a que todos lembram ao pensar em acústica. A absorção sonora é importante porque determina fortemente a duração do evento sonoro dentro do ambiente. Em salas com pouca absorção sonora, o som permanece por bastante tempo batendo em todas as paredes. Em salas com grande absorção sonora, o som encontra um material com grande capacidade de redução da sua energia, e com isso há menos reflexões, o que causa uma redução da sensação espacial. O ambiente com mais absorção é no meio do céu, dentro de nossa atmosfera, onde ao emitirmos um som, ele é disparado em todas as direções e não retorna. Podemos reproduzir esse efeito em uma câmara anecoica, a qual absorve aproximadamente 90 a 99% das ondas sonoras que chegam nas paredes, teto e piso. Um material acústico com grande absorção sonora é então importante para evitar reflexões indesejadas, que podem causar a sensação de eco (um som retornando atrasado e que causa uma confusão mental de localização da fonte sonora, e falta de clareza na mensagem que o som carrega).
O parâmetro mais usado em acústica arquitetônica é o coeficiente de absorção do material, que vai de 0 a 1, de forma que zero representa um material puramente refletivo, e “um” representa um material totalmente bom para absorver. O segredo de um projeto acústico está em balancear os materiais de absorção, de forma que uma união de materiais com absorções em diferentes frequências trabalhem juntos para gerar um ambiente mais homogêneo e equilibrado. É como aplicar um equalizador em sua sala, só que de forma passiva, equilibrando os graves, médios e agudos para que a influência das reflexões do piso, teto e paredes sejam equilibradas e que não deixem uma frequência em específico mais em evidência do que as demais. Esses problemas de uma frequência mais em destaque em geral é um problema de tonalidade da sala, que pode estar associado à característica modal da sala e em geral não é somente resolvido com materiais de absorção. Um bom design da sala, em termos geométricos, é essencial para evitar esses artefatos sonoros ruins. Mas isso é tópico desse e-book sobre como equalizar o som da sua sala.
Voltando para a questão estética dos materiais de absorção sonora, em geral eles são porosos ou fibrosos, os quais absorvem bem o som em altas frequências, sendo que você pode esconder um material poroso ou fibroso atrás de um elemento “transparente” como uma membrana fina, um tecido ou ainda qualquer outra camada fina e pouco rígida. Quando se combina uma camada rígida de densidade superficial controlada com uma cavidade atrás, pode-se ter materiais com absorção sonora projetável para baixas frequências. Quando se utiliza chapas perfuradas com uma taxa específica de perfuração por sobre uma cavidade, com ou sem material de absorção no interior, pode-se conseguir absorver somente frequências médias. E quando se usa somente o material de absorção diretamente exposto ao som, pode-se absorver as altas frequências. O pulo do gato é procurar fornecedores com um bom apelo estético para os materiais que você está especificando de forma técnica, a depender da faixa de frequência de atuação, sempre aliando com a disponibilidade de orçamento do cliente. Porque para a estética visual o céu é o limite em termos de preços, visto que o valor percebido pode ir muito além da funcionalidade técnica acústica que tem um limite definido pela física do fenômeno e pela capacidade tecnológica do material.
Passo 3: Difração, o que é isso?
Confesso que essa propriedade é muito complexa e poucas pessoas conseguem considerar isso em seus projetos. Em ambientes abertos é mais fácil prever e estimar o quanto um som pode realmente contornar um objeto, visto que há poucas reflexões e os modelos matemáticos e computacionais são mais previsíveis. Agora em ambientes fechados, uma barreira acústica: como um biombo; pode ter sua eficácia bem reduzida a depender das características de reflexão e absorção da sala. O que quero dizer é que ao colocar anteparos em uma sala com muita reflexão, pode ser que esses anteparos sejam inúteis! Em uma sala com absorção sonora é mais fácil ver diferença ao se colocar anteparos que visam reduzir alguns decibels do som em certas posições específicas. A relação entre o tamanho da barreira ou do sonorrefletor está muito associado com a frequência com a qual ele atua, sendo que barreiras ou refletores com pouco tamanho terão pouca eficácia em refletir ondas sonoras “grandes”, ou seja, frequências graves. Se você quiser aprender mais sobre isso, recomendo um curso específico, o Curso de Acústica de Salas de Espetáculo e Igrejas com o Prof. Lineu Passeri Jr. Vai lá e confere, ok?
Abraços e nos vemos do outro lado do Portal!
PhD. MBA MEng. Mec. Pablo Serrano – CEO do Portal Acústica
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