O que é o Efeito Lombard e a relação entre ruído e esforço vocal?

O que é o Efeito Lombard?

Fonte: https://www.portablepartitions.com.au/article/classroom-acoustics-what-to-do-when-it-doesnt-sound-right/

Em um ambiente ruidoso, temos a tendência involuntária de tentar superar o ruído elevando a intensidade da voz. Esse fenômeno físico, chamado Efeito Lombard ou Sinal de Lombard, não apenas tem implicações na intensidade da voz, como também na frequência fundamental e estabilidade da voz de indivíduos.

Em 1911, Étienne Lombard descreveu em seu artigo “Lê signe de l’elevation de la voix” [1] os primeiros estudos da tendência natural do indivíduo em elevar o volume de sua voz diante da dificuldade de ouvi-la, seja por exposição ao ruído ou por deficiência auditiva. Suas pesquisas contribuíram para o desenvolvimento de estudos sobre a relação entre a fala e a audição.

Qual a importância do Efeito Lombard?

O Efeito Lombard pode influenciar significativamente a vida de pessoas que, no desenvolver de suas atividades diárias, frequentam ambientes ruidosos e têm necessidade de comunicar-se constantemente. No caso de ambientes escolares como salas de aula, por exemplo, a avaliação audiológica de professores é fundamental para garantia do funcionamento das competências auditivas que contribuem para a eficácia do processo comunicativo.

A avaliação do Efeito Lombard pode também ser utilizada para fins médicos: há estudos que avaliam o comportamento do volume e da frequência fundamental, bem como a estabilidade da emissão vocal de pacientes com Doença de Parkinson quando expostos ao mascaramento auditivo. Pacientes com Doença de Parkinson são sujeitos a um conjunto de alterações na fala, denominado disartria hipocinética ou disartrofonia, sendo comuns sintomas como diminuição do volume vocal, instabilidade vocal, monotonia, alterações qualitativas como tremor, rouquidão e alteração do pitch, dificuldade para iniciar uma sentença, alterações articulatórias, fala acelerada e repetição de palavras. O Efeito Lombard promove aumento significativo na intensidade, estabilidade e na frequência fundamental de emissão vocal dos indivíduos com Doença de Parkinson.

Fonte: https://rtcbusinesspark.co.uk/how-office-noise-can-affect-staff-more-than-you-think/

Parâmetros aplicáveis para avaliação do Efeito Lombard

A norma ISO 9921-1 (Ergonomics – Assessment of speech communication — Avaliação ergonômica de comunicação de voz – Parte 1) classifica os valores relativos ao nível de pressão sonora equivalente contínuo ponderado na escala A de esforço ideal para intensidade vocal utilizada para conversação, sendo aferida a uma distância de 1,0 metro da fonte sonora, conforme a tabela seguir:

Nível de pressão sonora de esforço ideal para intensidade vocal

Categoria	Nível de Pressão Sonora dB (A)
Relaxada	64-69
Normal	70-75
Moderada	76-81
Alto	82-87
Muito alto	88-93
Gritando	94-90

Fonte: ISO 9921-1 (2003)

Este esforço pode ser ultrapassado quando ocorre mascaramento da fala devido ao ruído de fundo. O aumento do nível da fala em função do nível de ruído ambiente ponderado em A pode ser avaliado pelo descritor c (Lombard slope ou inclinação Lombard).

[2] indica que o nível da fala aumenta em função do ruído ambiente na faixa de c = 0.3 a 0.6 dB por acréscimo de 1 dB do nível ambiente para ruídos acima de 40 – 50 dB. Para ruídos entre 30 e 40 dB, o ruído ambiente tem efeito pouco expressivo no nível da fala.

[3] indica uma relação de 0.57 entre o aumento do ruído ambiente e o volume da voz. Isto significa que a cada 10 decibels (dB) de mascaramento auditivo binaural nível de sensação, obtém-se 5,7 dB de aumento do volume da voz. O resultado foi obtido por meio de testes de leitura de frases enquanto a pessoa avaliada era induzida a não escutar a própria voz devido ao mascaramento auditivo binaural.

[4] indica que o efeito Lombard tem seu início caracterizado em um nível de ruído ambiente em torno de 45 dB e um nível de fala de 55 dB. O autor sugere que a inclinação de Lombard c geralmente varia entre c = 0.5dB e 0.7dB. Assumindo uma relação linear (sempre observando que os valores em dB já são logaritmicos) para níveis de ruído acima de 45 dB, o nível da fala pode ser expresso pela equação:

onde L_NA é o nível de ruído ambiente, c é a inclinação Lombard, para níveis de ruído ambiente acima de 45dB ou níveis de fala acima de 55dB.

O nível de ruído ambiente L_NA, por sua vez, pode ser descrito por:

, onde:

A é a área equivalente de absorção sonora da sala;

N_S é a quantidade média de pessoas falando;

g é o tamanho do grupo;

N é o número de pessoas.

Lembrando que esses parâmetros acima são mais facilmente identificados pelos arquitetos que projetam os espaços físicos e os consultores acústicos, os quais tem a capacidade de avaliar quais materiais acústicos podem melhorar a absorção da sala gastando o mínimo necessário. 

Como é realizado o Teste de Lombard?

Fonte: http://www.medicalexpo.com/pt/prod/gaes/product-81252-673302.html

O teste de Lombard pode ser utilizado para objetivos variados, como para avaliação da Perda Auditiva Funcional em pacientes. Neste caso, as baterias de exame devem incluir, além do teste de Lombard, outros testes voluntários ou subjetivos, tais como a audiometria tonal por via aérea e por óssea, limiar de recepção de fala (LRF), índice de reconhecimento de fala (IRF) e teste de Stenger.

Para realizar o teste de Lombard, recorre-se à uma cabine acústica, à prova de sons, onde o paciente deve ficar sentado e colocar fones de ouvido. Um ruído branco de mascaramento é introduzido pelos fones de ouvido à medida que o paciente lê um texto em voz alta. O ruído se assemelha ao som do mar ou de uma TV fora do ar. O examinador vai aumentando a intensidade do ruído enquanto o paciente lê, monitorando o volume da voz do paciente por meio do reprodutor de conversa do audiômetro no medidor de volume. No caso da identificação de perda auditiva real no paciente, não ocorrerá alteração do volume da voz do paciente porque ele não ouvirá o ruído de mascaramento. Caso o paciente tenha PHA¹ (Pseudo-Hipoacusia), o volume da sua voz irá aumentar.

A importância da qualidade acústica de salas

Em ambientes onde a comunicação oral é necessária, pode ocorrer do ruído externo se somar ao ruído interno, resultando na necessidade de elevação da intensidade vocal. Para garantir o conforto acústico e evitar a fadiga, estresse ou outros problemas de saúde do locutor, é essencial que sejam propostas soluções para o isolamento e condicionamento acústico da sala. No caso de ambientes escolares, por exemplo, deve-se controlar o nível de ruído para garantir o processo de ensino-aprendizagem. Também em auditórios, restaurantes e outros locais onde a necessidade da fala é frequente, o tratamento acústico de salas é essencial para a eficácia do processo comunicativo e para evitar fadiga. Em outros ambientes como bibliotecas, é essencial garantir níveis de pressão sonora baixos, o que naturamente faz falarmos mais baixo por simples adaptação ao meio. Isso sim é que é darwinismo…

 

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¹ Pseudo-hipoacusia (PHA) é o termo usado para descrever os comportamentos auditivos discrepantes com os resultados dos testes audiológicos, resultados inconsistentes/inválidos nos testes ou perda alegada da sensibilidade auditiva sem qualquer alteração orgânica.

Referências

[1] Lombard, É. “Le signe de l’élévation de la voix”. Annales des Maladies de L’Oreille et du Larynx. XXXVII (2): 101–9, 1911.

[2] Lazarus, H. “Prediction of verbal communication is noise—A review: Part 1,” Appl. Acoust. 19 (6), 439–464, 1986.

[3] Black, J. W. The effect of delayed side-tone upon vocal rate and intensity. J Speech Disord,16(1): 56-60, 1951.

[4] Rindel, J. H. Acoustical capacity as a means of noise control in eating establishments. Joint Baltic-Nordic Acoustics Meeting. June 18th – 20th, Odense, Denmark, 2012.