O que é paisagem sonora?

A paisagem sonora é compreendida como o ambiente acústico que é percebido, experimentado ou apreciado pelas pessoas em um determinado contexto, e é resultado da interação entre os fatores humanos e físicos do espaço em questão [1]. 

Diferente do que é comumente abordado nos estudos tradicionais da acústica ambiental – a do controle do ruído – a paisagem sonora foca na valorização e gestão dos sons como elementos fundamentais na transformação dos ambientes acústicos a partir do interesse da sociedade. 

Isto não significa que a paisagem sonora e o controle do ruído ambiental sejam abordagens antagônicas. Muito pelo contrário, são complementares, uma vez que se torna cada dia mais importante a avaliação holística do ambiente acústico a partir de parâmetros objetivos e subjetivos. 

Entendemos o ruído como um som de natureza desagradável ou indesejável, portanto subjetivo e função de um contexto no qual é percebido. Desta maneira, um mesmo som pode ser interpretado como ruído a depender deste contexto. Por exemplo, o canto dos pássaros pode ser um som agradável durante um passeio no parque, contudo, durante a madrugada, quando a maioria das pessoas está dormindo e não quer ser incomodada, até o belo canto dos pássaros se torna ruído.

A grande contribuição da paisagem sonora é incorporar nos estudos de acústica ambiental o caráter qualitativo do som. Isto significa dizer que além de avaliarmos se os níveis equivalentes de pressão sonora são confortáveis, também devemos avaliar as características das fontes sonoras que compõem o ambiente acústico, bem como a percepção dos usuários deste espaço sobre essas fontes sonoras.

De modo geral, a paisagem sonora irá avaliar a percepção, positiva ou negativa, que as pessoas possuem sob determinado ambiente acústico em um dado contexto. Imagine que você irá à um parque ou praça para caminhar e praticar atividades físicas. Quais sons você espera ouvir durante atividades ao ar livre? Quais sons você não espera ouvir durante atividades ao ar livre? O design da paisagem sonora deve corresponder à expectativa do usuário daquele ambiente, não somente em termos de Nível de Pressão Sonora, mas também com relação às qualidades das fontes sonoras. 

E falando em fontes sonoras, a maioria das pessoas costuma preferir sons de origem natural, como água corrente, farfalhar de folhas ao vento, canto de aves canoras etc. Isto inclusive é evidenciado em pesquisas que utilizam a paisagem sonora para a avaliação acústica de ambientes internos.

Percentual de sons identificados como desagradáveis em um Parque Ambiental. Fonte: Moras et al (2019)

Uma boa gestão da paisagem sonora, em concordância com a paisagem visual e aspectos de relevância para o usuário, leva a uma avaliação positiva do ambiente acústico mesmo em situações de níveis sonoros próximos aos estipulados como desconfortáveis [2,3]. Claro, é imprescindível que os níveis sonoros sejam controlados de modo que não provoquem danos à saúde dos usuários, mesmo que em sua avaliação o incômodo sonoro não seja relatado. 

No Brasil a avaliação da qualidade acústica de espaços abertos é feita com base nas diretrizes da NBR 10.151 editada pela Associação Brasileira de Normas Técnicas. No entanto, a norma faz referência em maioria à parâmetros objetivos do som, como níveis equivalentes de pressão sonora. 

Ainda não há no Brasil diretrizes para a avaliação da paisagem sonora. Contudo, métodos para esta finalidade podem ser encontrados na ISO 12913-1 que trata especificamente sobre definições e avaliação de paisagens sonoras. Uma alternativa à ISO é o Protocolo Sueco de Qualidade de Paisagem Sonora (SSQP – Swedish Soundscape Quality Protocol), uma ferramenta que avalia e classifica os ambientes sonoros com base em escalas de agradabilidade das diversas fontes sonoras que compõem o ambiente acústico em questão.

Outra maneira de qualificar a paisagem sonora é a partir de entrevistas realizadas simultaneamente com medições e gravações sonoras. Nestas entrevistas são identificados aspectos demográficos associados ao uso do espaço em questão, como frequência e motivo de visitação; e acústicos, como a avaliação qualitativa do ambiente acústico, nível sonoro e tipo e quantidade de fontes sonoras. 

A partir destes resultados, e em conjunto com ferramentas como mapas de ruído, é feito um diagnóstico da paisagem sonora no qual é possível compreender quais sons são agradáveis naquele espaço e contextos. 

A paisagem sonora se mostra como uma ferramenta complementar poderosa na avaliação acústica de ambientes externos e recentemente vem ganhando destaque também no projeto acústico de ambientes internos. 

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Sobre o autor:

Paulo Chagas Rodrigues é Engenheiro Civil mestre em arquitetura e urbanismo e especialista em conforto ambiental e sustentabilidade do espaço construído, ambos pela UFPA. Atua principalmente no desenvolvimento de absorvedores sonoros, ensino e aprendizagem de acústica em arquitetura e avaliação de paisagens sonoras em espaços públicos.

Referências: 

SCHAFER, R.M. A afinação do mundo. Unesp, São Paulo, 2012. 

MORAES, E.L; RODRIGUES, P.C; ARAÚJO, I.B; FARIAS, M.S. Avaliação da percepção da paisagem sonora de um parque urbanos. Anais do XV Encontro Nacional de Conforto no Ambiente Construído, João Pessoa, 2019. 

SOARES, A.C.L; RODRIGUES, P.C; PEREIRA; B.S; AZEVEDO; J.C.N; MENDES, A.D.S. A contribuição da paisagem sonora à preservação dos jardins históricos: o caso do Parque Zoobotânico do Museu Paraense Emílio Goeldi em Belém, Pará, Brasil. Revista leituras paisagísticas: teoria e práxis, nº 8, p. 77-97, Rio de Janeiro, 2019. 

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, A. B. N. T. NBR 10151. Acústica-avaliação do ruído em áreas habitadas, visando o conforto da comunidadeprocedimento. 2019. 

INTERNATIONAL ORGANIZATION FOR STANDARDIZATION, Acoustics – Soundscape – Part 1: Definition and conceptual framework. 2014. 

AXELSSON, Ãsten; NILSSON, Mats E.; BERGLUND, Birgitta. The Swedish soundscape-quality protocol. The Journal of the Acoustical Society of America, [s.l.], v. 131, n. 4, p. 3476-3476, abr. 2012. Acoustical Society of America (ASA). http://dx.doi.org/10.1121/1.4709112