Semperoper em Dresden: Uma experiência acústica na Europa
Por: Claudio Roberto Ghiorzi – EPBA 1.0
Realizei, juntamente com minha esposa, uma viagem de lazer durante 30 dias por algumas cidades da Europa. Visitamos Berlim e Dresden na Alemanha, Amsterdã na Holanda, Lisboa, Sintra, Coimbra, Porto, a região das vinícolas do vinho do porto no Douro e Covilhã, no pé da serra da Estrela, em Portugal. Todos, lugares muito lindos e com muitas peculiaridades. Mas não quero falar exatamente dos pontos turísticos da viagem, e sim dos aspectos acústicos dela.
Durante nossa viagem, ficamos hospedados em casas de habitação comuns (por exemplo ficamos no apartamento de nosso filho que mora em Berlim e também em alguns Airbnb), hotéis e também em uma mansão que foi transformada em hotel.
Além disso, visitamos muitos lugares fechados como salas de Ópera, Teatros, Museus, bares, restaurantes, lojas, etc.
O conforto térmico X conforto acústico
A Europa é um continente com temperaturas muito baixas durante grande parte do ano. Por causa disso, as construções são preparadas para que se tenha um conforto térmico bastante eficiente. É uma questão de sobrevivência.
As janelas e portas externas são construídas ou escolhidas em função do isolamento térmico. As esquadrias são especiais, com vidros duplos e totalmente vedadas. Já as portas externas são muito grossas e pesadas. Em ambientes de muita circulação, como em lojas ou prédios comerciais, as portas são automáticas para ficar o menor tempo possível abertas. Algumas, inclusive são rotativas e montadas em um sistema de parede dupla, de tal forma que quando uma parede está bloqueada pela porta giratória, a outra está aberta. Assim, mesmo com a passagem de pessoas a porta nunca está totalmente aberta.
Também por causa do conforto térmico, as paredes de alvenaria das construções são normalmente revestidas com materiais térmicos como o dry-wall. Muitas divisórias internas são também feitas apenas com dry-wall.
Mas e como é a acústica desses lugares? A partir de agora vou falar um pouco das minhas impressões sob o ponto de vista da acústica dos lugares que visitamos durante essa viagem.
A preocupação vital com o conforto térmico traz um efeito colateral muito importante nas questões que envolvem o tratamento acústico dos ambientes. As mesmas esquadrias, portas e paredes que isolam a temperatura também são importantes para o isolamento acústico. Ao se fechar uma janela térmica, o ruído fica lá fora.
O tratamento térmico das paredes externas também faz com que a transmissão do ruído, que poderia acontecer por vibração mecânica, seja minimizada. Mesmo em lugares onde se tem muito trânsito ou ruídos de construção, por exemplo, o isolamento térmico das paredes externas e esquadrias faz com que o conforto acústico também seja tão bom quanto o conforto térmico. Este é um ponto muito positivo que se observa em praticamente todos os lugares.
Mas, infelizmente este conforto acústico não é tão bom quando se analisa os interiores das construções. Pelo fato de se utilizar muitas paredes divisórias que não são de alvenaria, o isolamento acústico entre salas contíguas não costuma ser tão bom.
De uma maneira geral, o ruído das instalações hidráulicas é grande. Seja em hotéis ou nas casas, é possível ouvir da sala o ruído da água nos encanamentos do banheiro.
Nos hotéis também é comum escutar o ruído de pessoas andando e falando nos corredores.
Ficamos em um hotel em Amsterdam em que o nosso quarto ficava embaixo da sala em que o café da manhã era servido. O barulho de cadeiras e saltos de sapatos era em um nível bem alto.
Pode-se concluir disso que o conforto acústico que se nota principalmente no isolamento de ruídos externos ocorre em função da necessidade que os europeus têm de ter um conforto térmico que lhes é fundamental e até vital. E, quando se trata do conforto térmico, está se tratando também, intrinsecamente, de parte do conforto acústico.
O que foi descrito até agora é nada mais do que uma simples observação geral sobre as condições acústicas das edificações na Europa. Mas ao longo da viagem também tive algumas experiências em ambientes tratados acusticamente. Compartilho a seguir o caso da Semperoper, em Dresden.
Semperoper – Dresden
Em Dresden, na Alemanha, visitamos uma casa de ópera, a Semperoper. É a casa da Companhia Opera Estatal de Dresden e também a sala de concertos da Orquestra Estatal de Dresden. Foi construída em 1841 pelo arquiteto Gottfried Semper, em estilo eclético, com características do Renascimento, do Barroco e do Coríntio.
O prédio sofreu um incêndio em 1869 quando foi destruído. Foi reconstruído em 1878 com estilo neo-Renascentista pelo filho do Semper, mas com a supervisão do pai que estava exilado em Viena.
A construção foi novamente destruída pelos bombardeios dos aliados na Segunda Guerra e a nova reconstrução aconteceu 40 anos depois, em 1985, com base no projeto original de 1878.
Mas, os estragos materiais e econômicos da guerra fizeram com que o orgulhoso povo saxão fizesse a reconstrução da cidade, que foi praticamente destruída, de uma forma mais econômica e criativa, utilizando mão de obra local e materiais mais eficientes e baratos. E no caso da reconstrução da Semperoper não foi diferente.
No hall de entrada da casa, por exemplo, as colunas de mármore faziam parte da estrutura do edifício no projeto original. Na reconstrução, estas colunas não são mais parte integrante da estrutura, mas somente peças decorativas. Também não são mais feitas do caríssimo mármore importado da Itália mas sim de estuque – que leva um tratamento para dar a aparência e a textura de mármore polido. Se essas colunas fossem removidas, nada cairia.
O grande auditório da Semperoper, com capacidade para 1309 pessoas e o palco foram projetados para que não seja necessário o uso de microfones ou qualquer tipo de amplificação, tanto para os instrumentos da orquestra, como para os cantores.
A sala tem um volume de 12.500m³ e um tempo de reverberação de 1,8s, de acordo com dados do livro Auditorium Acoustics and Architectural Design. Por ser uma sala tão grande, não há a necessidade de absorvedores de som. O que mais importa em termos de acústica são os difusores/refletores. Isso porque a finalidade do uso da sala, que são óperas ou concertos de orquestras, não exige um tempo de reverberação muito pequeno. O mais importante é que o som sofra muitas reflexões para que se espalhe por toda a sala.
A sala é redonda e em toda a sua volta se vê refletores. Alguns voltados para baixo e outros voltados para cima. O grande teto arredondado é convexo o que o torna um bom refletor sonoro. A rugosidade no formato de todas as superfícies internas as transforma em difusores.
Abaixo tem um detalhe das conchas acústicas (refletores) em todos os balcões.
Infelizmente, não conseguimos assistir nenhum espetáculo na Semperoper. Fizemos uma visita que não foi técnica (acusticamente falando), mas histórica. As observações sobre a acústica foram uma experiência pessoal, baseada nos meus conhecimentos sobre o assunto.
Sobre o autor: Claudio Roberto Ghiorzi é Engenheiro de Telecomunicações e participa da primeira turma do EPBA. Trabalhou durante 40 anos em uma rede de TV dos estados de São Paulo e Minas Gerais, afiliada da Rede Globo. No Departamento de Engenharia, foi responsável por trazer novas tecnologias relacionadas à captura, edição, pós-produção e armazenamento de conteúdo de vídeo, áudio e dados. É músico e apaixonado por acústica, assunto ao qual se dedica ultimamente.
Trackbacks & Pingbacks
[…] acústicos das cidades que visitei. Eu já falei aqui no portal Acústica sobre o caso da Semperoper em Dresden, na Alemanha e hoje vou abordar um pouco do que acompanhei da acústica em […]
Deixe uma resposta
Want to join the discussion?Feel free to contribute!