Os desafios do conforto acústico frente a subjetividade individual
O que é barulho, zumbido ou fontes indesejadas nas grandes cidades? A relação entre os benefícios advindos da modernidade e a subjetividade individual de cada um é que nos deixam intrigados, visto que para alguns o som da cidade é agradável, e para outros é insuportável. Neste artigo discutiremos como as fake news nos apresentam mitos que deixam muitas pessoas em dúvida em relação a qual material acústico adquirir.
Questões relacionadas a perigo, fatores de risco, riscos elevados, zona de risco e de aproximação são assuntos tratados pela segurança do trabalho. Os processos de medição com rastreabilidade metrológica e com idoneidade são premissas inclusive de profissionais capacitados e qualificados que atuam na avaliação e na proposta de soluções acústicas em ambientes com grande complexidade.
Por exemplo, ao usar um celular para medir o som e propor soluções sem qualquer domínio da técnica e conhecimento da área, como enclausurar equipamentos que necessitam de ventilação e que estão em áreas classificadas ou de risco é uma imperícia e uma negligência. O impacto social destas imperícias pode ser imenso, tanto nas redes sociais: perpetuadas por pessoas de boa intenção sem conhecimento aprofundado, quanto na falta de energia elétrica, devido a eventos como explosões e incêndios que advém destas práticas incorretas. A perda do patrimônio e os impactos sociais nas comunidades próximas por imperícia podem gerar uma catástrofe em todos os sentidos. Como exemplo, o enclausuramento acústico em áreas de risco ou de controle no interior de subestações de energia podem gerar perda do patrimônio e impactos sociais nas comunidades lindeiras.
Fonte: 3R Brasil – Tecnologia Ambiental. https://www.3rhsec.com/noiseadvisor.html
Som, ruído, zumbido, barulho, só fazem sentido se forem sentidos no nosso cortex auditivo, e são também dependentes da situação acústica existente no local. Para termos uma boa noção de como isso se traduz em conforto sonoro, precisamos saber o que representa o silêncio e o que é ruído residual no ambiente, visto que isso é dependente da subjetividade individual de cada um e cada ambiente estimula ou absorve certas frequências.
Para avaliar o efeito do incômodo, do zumbido relacionado ao som tonal, temos que observar a atenção individual de cada um em relação ao silêncio daquele ambiente. A avaliação do conforto deve se basear em dados de sonômetros com alta exatidão, homologados pela IEC 61672, e calibrados no sistema metrológico nacional. Diferenças de 3 dB nas medições equivalem a um aumento ou diminuição da intensidade sonora na ordem de 2x. Entretanto, 3 dB é uma variação de volume sonoro meramente perceptível, sendo bem pequena em termos de sensibilidade humana. Por exemplo, caso utilizemos dois alto falantes num ambiente e desligarmos um deles, o nível de pressão sonora diminui em 3dB, isto é, houve a diminuição de 50% das emissões sonoras, entretanto, para termos uma sensação auditiva de 50% de redução da amplitude deste ruído, precisaríamos de cerca de 10 dB para conseguir esse efeito.
Quando duas pessoas estão emitindo o mesmo nível de pressão sonora ao falar, sabemos quem está falando pela percepção das frequências sonoras presentes naa voz, as quais compõem o timbre da pessoa, que nada mais é do que a união dos tons e harmônicos dessas emissões, assim como a direção para a qual a fonte sonora (pessoa) está virada e a distância entre nossas orelhas e a pessoa. Portanto, são evidentes os desafios da acústica nos ambientes das grandes cidades, onde há comunidades e diversas fontes sonoras simultâneas. Mesmo abaixo dos limites legais de poluição sonora, pode haver grande incômodo sonoro das pessoas em função da percepção individual de cada um e em função do ruido residual presente no ambiente. O silêncio também incomoda, por mais incrível que pareça, pois passamos a ouvir sons indesejados intermitentes ou impulsivos, os quais por vezes são tão abruptos que chegam a nos acordar no meio da noite. Variações momentâneas acima de 5 dB já podem causar queixas esporádicas a intempestivas a depender da região de onde elas ocorrer, e esse valor é conhecido dos engenheiros acústicos, visto que é justamente a penalização que deve ser aplicada a medições que contenham tais eventos impulsivos.
A soluções acústicas devem contemplar todos esses fatores, principalmente em ambientes de baixo ruído de fundo (silenciosos). Por exemplo, grandes variações do ruído residual em ambientes próximos a subestações de energia são extremamente incômodos. As subestações são fontes de ruído continuo, de menor impacto no incômodo, contudo, dependendo da distância podem apresentar sons tonais, necessitando de técnicas específicas de controle de ruído, como sistemas de mascaramento ou atenuação através de dispositivos específicos de controle da frequência indesejada, a qual é identificada por sonômetros analisadores de frequência com capacidades avançadas de 1/6 ou 1/12 de oitava.
No projeto de pesquisa realizado no Leme – Rio de Janeiro, por exemplo, as emissões sonoras foram atenuadas em cercas de 3 dB em relação aos valores globais, apenas com manutenções e processos operacionais entre os dois trafos. Com a técnica de mascaramento houve uma diminuição de 4 a 5 dB no nível de pressão sonora corrigido ao relacionar os resultados com as emissões contendo componentes tonais. Contudo, embora hajam as mudanças na paisagem sonora e as melhorias implementadas nos sistemas ruidosos, o ouvido acostuma com a nova situação e a subjetividade individual de cada pessoa deve ser considerada na análise, pois diversos fatores geram as queixas que podem estar ligadas ao ruído. Hoje o som relacionado a subestação do Leme nas fachadas dos prédios vizinhos (47 dBA à 53 dBA) é menor do que a maioria das unidades externas de ar-condicionado (46 dBA a 64 dBA), e muito abaixo do prejudicial considerando que ao entrar nas residências esse ruído reduz cerca de 10 dB mesmo com a janela aberta. A técnica de mascaramento que a população usa de forma intuitiva ao ligar o ar-condicionado durante a noite para sobrepor o som do vizinho que não para com a música também está sendo aplicada de forma inovadora na área. Prova disso é o estudo elaborado por Eliane Jorge dos Santos e outros pesquisadores do SENAI e do IPT que apresentaram os resultados de equipamentos de ar-condicionado Split convencionalmente são encontrados no mercado. O trabalho foi publicado na revista Técnico-Científica do CREA-PR e evidencia a importância do selo de ruído para equipamentos de ar condicionado, visto que a grande maioria não atende aos requisitos de conforto nas construções brasileiras. Foram realizadas medições de ruído em quartos comuns, dentro e fora do cômodo para avaliar o ruído da evaporadora e da condensadora. Os pontos de algumas das medições estão ilustrados abaixo.
Observe que os resultados das medições na tabela abaixo com o equipamento desligado e com o equipamento ligado apresenta uma perda do conforto nos ambientes pelo aumento da curva NC (Noise Contour). Observe que a análise de atendimento aos critérios da norma técnica ABNT NBR 10152 foi realizado através da versão antiga da norma de 1987, pois a mesma estava em revisão durante a elaboração do artigo. Entretanto, fica claro que em muitos casos o atendimento ao requisito de ruído é meramente aceitável, mas não atende à norma.
Agora se observarmos os dados da nova versão da ABNT NBR 10152 será possivel verificar que não há mais critérios aceitáveis, mas somente um valor de referência para cada tipo de cômodo. Portanto, nesta nova avaliação, praticamente todas as medições com o equipamento de ar condicionado ligado apresentam não conformidade com a norma técnica, de forma que os equipamentos de ar condicionado não fornecem conforto suficiente em ambientes que utilizam sistema construtivo em alvenaria.
Fonte: ABNT NBR 10152:2017
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A mudança da paisagem sonora é uma das inovações empregadas, principalmente em ambientes corporativos como escritórios de planta aberta, open plan. O mascaramento em escritórios garante que se criem zonas de privacidade ou ainda zonas de menor distração, visto que não será possível entender o que se fala em uma estação de trabalho a uma certa distância da sua, quando aquele colega do comercial começa a falar de futebol ao telefone e você está preocupado em finalizar o relatório para entregar no fim do dia. Se bem que muitos escritórios hoje em dia são home offices, e portanto o que incomoda é a criançada brincando na sala enquanto você trabalha na sacada (único cômodo vazio do apartamento que você conseguiu colocar uma mesa e um notebook).
O projeto de pesquisa e desenvolvimento que está sendo executado na concessionária de energia do Leme, no Rio de Janeiro tem o objetivo de mitigar as emissões de ruído para os valores determinados pelo Ministerio Público. Além disso pretende-se gerar soluções nacionais confiáveis, seguras e certificadas, com adequação de fornecedores nacionais para que a indústria brasileira atue com inovações factíveis. Ao atuar nesses ambientes classificados e zonas de riscos próximo aos transformadores das subestações, se contempla o estado da técnica ao propor soluções acústicas ativas e passivas que permitam não só atender aos limites normativos, mas também a questões individuais do incômodo.
A pandemia do Covid-19 também teve um grande impacto sistêmico nessa percepção individual com a diminuição da poluição do ar em termos de poluentes suspensos e também de ruido residual nas grandes cidades, devido a menor circulação de veículos nas rodovias e nos aeroportos. A rotina nos escritórios depois da pandemia foi repensada, com o home office, mais espaço e mais ventilação é necessário. O uso de novas tecnologias deve permitir que o ar-condicionado deve fornecer maior renovação ar e a ventilação natural deve passar a ser mais utilizada. Contudo, somadas a soluções acústicas, aos filtros de ar, com os novos protocolos de limpeza e de higienização do ar externo, teremos ambientes muito mais saudáveis e confortáveis.
Autor: Rogério Dias Regazzi
Diretor da 3R Brasil Tecnologia Ambiental e do site isegnet.com.br, responsabilidade técnica em Engenharia Mecânica, Saúde e Segurança do Trabalho e Meio Ambiente, possui mestrado em metrologia e qualidade industrial com especialidades em automação e nas ciências das medições com foco em acústica e vibrações. Autor de três livros de engenharia e de diversas patentes industriais. Ministra cursos especiais de Acústica e Vibração Ocupacional e Ambiental. Desenvolve ferramentas com programação Labview e Phyton. Possui parceria com a empresa holandesa DGMR com representação exclusiva dos modernos softwares NoiseAtWork, MapAtWork e iNOISE. Parceria e cursos especiais com a Ambergo e Alvo Acústica de Portugal, com destaque aos equipamentos da CESVA, MMF, Delta Ohm e da Svantek. Desenvolve e realiza ensaios com modernas bancadas de medição com os sistemas da NI – National Instruments. Ex Cientista e Pesquisador do INMETRO na Divisão de Acústica e Vibrações e da ANP no Departamento de Engenharia Mecânica da PUC-Rio: Professor horista desta Universidade. Referência em Acústica e Vibrações Ambiental, Ocupacional, e, Norma de Desempenho de Edificações NBR 15575, além de processamento de dados georreferenciados com RPA. Autor de três livros de engenharia hoje referência na área e em concursos públicos. Desenvolvedor e autor dos App(s) NoiseAdvisor e VibAdvisor, com destaque ao projeto Socio-Ambiental: “Um Toque na Orelha” , “Simplesmente eDigital”, “Consulta eSocial” e em programas de sensoriamento e inspeções de engenharia com DRONES e tecnologias IoT chamado de BlueAeroVision. Atua em Soluções Smart Cities com os sistemas de vigilância da poluição sonora NoisePlatform e Lidaco da CESVA em conjunto com as soluções de monitoramento remoto como o Provar – Programa de Vigilância Acústica Remota. Integração de Drones nas medições e levantamentos georreferenciados com processamentos de dados e modelagens ocupacionais e ambientais. Projetos de acústicos de alto desempenho. Pesquisador Lider do Projeto P&D da Aneel.
Co-autor e Editor: Pablo Giordani Serrano
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